tem-me debaixo do polegar, senhor professor

tem-me debaixo do polegar, senhor professor

Diga-me,
para onde foi o seu futuro?
Lutou mal enquanto viveu
e nem teve a decência de morrer.
O senhor é o seu próprio túmulo,
o seu próprio homenzinho de estimação.
Nunca lhe vi o branco dos olhos,
mas sei-o só berros inquietos,
fechado em copas nas pálpebras dóceis que nunca se entusiasmam.
O senhor tem a raiva de quem queria mais.
É frustrado com a sua condição de cadáver
e anseia o que eu tenho.
Por acaso ainda ouve algum sonho?
Ainda dança com lobos, sequer?
Ou limita-se a castrá-los?
Não me cativou nem uma única vez.
É animal de quinta, dormente, apático à vida, silencioso, cobarde.
Fala quanto baste por medo que lhe confisquem o banquinho em que se senta na mesa dos adultos, não é?
Deixa a sua íris preta expressar-se por si
e vai passando por entre os pingos da chuva.
Conte-me, quando é que se cansou de se mastigar?
Avise-me, por favor, para que eu nunca me canse.
Deixe-me adivinhar-lhe a rotina:
acorda e vai dormir perto da sua máquina fria,
no seu escritório verde que derrete sem parar,
sobre o qual polvilha coisinhas abstractas
para que se sinta mais alto.
Pois se assim for, então o vazio do seu olho substitui-o na perfeição.
Há quanto tempo se finge?
Se não é realeza, foi porque se esqueceram do senhor em masmorras de marfim,
com uma máscara de ferro que se colou à pele,
porque deixe-me que lhe diga, o senhor é o incesto monárquico, raça pura, a elite!
As veias fogem-lhe do interior e flutuam na superfície!
Aposto que se pica para que brilhem azul...
Peço-lhe
que me ensine.
Ensine-me tudo o que sabe!
Ensine-me outra vez a minha inerente falta de talento!
Ensine-me o quão longe vou ficar de tudo!
Invalide-me, com um abanar de mão, as respostas sinceras que lhe dei!
Vingue-se nos miseráveis que colecciona a cada ano!
Dobre-lhes as mãos num referencial cartesiano até que gritem e aceitem ser nada mais do que vectores!
Sacrifique-lhes a ambição, tempere-lhes o espírito curioso com os cristais que cria em laboratório, e banqueteie-se!
Desespere-lhes a juventude, ofereça-lhes solidão, convença-lhes da esterilidade das suas ideias!
Eu prendo pastilhas debaixo da secretária em que me empoleiro e rabisco sem nunca o ouvir!
Tem aí a sua deixa!
Chame-me ao quadro mais uma vez!
Dê-me a escolher um giz branco, o que eu quiser, e aproveite-me para se aumentar!
Pavoneie-se num estrado de madeira, agarrado a um nada que condensou, e humilhe-me por não saber, ou por nem sequer tentar!
Se me der um segundo, serei mais do que o senhor alguma vez foi!
Vá!
Faça a chamada!
E salte o meu nome quando este lhe manchar a lista!
Não o leia sequer, nunca!
Eu não lhe existo!
Não tenho disciplina, estou talhado para o fracasso, não tenho motivação, ética de trabalho, consigo ser violento e cruel, e não mereço muito.
tem razão
E tal como o senhor professor,
nem sequer chego a desiludir.
Mas ao contrário de si, hei-de morrer
de uma maneira fantástica
que ainda não descobri.

em tua honra v.h., por me permitires passar com 10, quando eu merecia chumbar

futrica ?

futrica ?

Abdiquei-me de mim próprio cedo demais. Não quero ser futrica, e procuro no recordar, viver estudantilmente, só mais uma vez.